“Minha essência representa coisas do meu passado”

Quando soube da vinda do folclorista João Carlos D’Ávila Paixão Côrtes ao sítio Paraíso das Orquídeas, me veio à mente as rodas de conversa, o mate, a prosa, a música, a bombacha, o lenço e a dança. De início busquei uma ligação entre seu personagem ao projeto que ele veio conhecer em Maralúcia. De encontro, veio a mensagem do próprio pesquisador e maior divulgador da cultura gaúcha. “Um povo reproduz e representa coisas do seu passado. Eu levo a mensagem dos livros, da música e dos versos com maior expressão do que aprendi nos galpões, na vivência em minha estância, como forma digna de mostrar que sou gaúcho”. É a singeleza do homem que atravessou o Rio Grande do Sul e veio orientar e ajudar uma comunidade a fazer o resgate da cultura como forma também de perpetuar seus costumes e sua tradição.

Paixão Côrtes representa o renascimento do tradicionalismo gaúcho. Em uma época em que as tradições rio-grandenses eram ignoradas, ele foi atrás das raízes de seu povo, junto com Barbosa Lessa, uma pessoa com pendor literário e intelectual. Como pesquisador, sua preocupação centrou-se em promover e desenvolver a cultura popular dentro da história do Rio Grande do Sul. Falar com essa figura inigualável, como símbolo de toda uma luta a qual passou o povo gaúcho, e do seu esforço em documentar toda a história, como fonte de pesquisa para as próximas gerações. Por mais que eu tente, não dá para explicar em palavras. Pena que não posso repassar nestas linhas o som de uma prosa autêntica e interiorana, saudosa ao mesmo tempo, do jeito simples de conversar deste personagem, os ‘Ba, os ‘Tchê’ de tempo em tempo.

Espero repassar à altura o que representa a figura de um homem que tem sua imagem eternizada em bronze na estátua do Laçador, na rótula de entrada da cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.

O pesquisador Paixão Côrtes possui um acervo de milhares de slides, centenas de fitas gravadas, filmes super 8 e vídeos sobre os costumes rio-grandenses. Todo esse material foi reconhecido e aprovado em vários Congressos Tradicionalistas. Suas investigações estenderam-se também a documentos e peças originais nos Museus do Louvre em Paris, no Museu do Trajo Português, em Lisboa, do Padro, em Madrid, no Victória e Albert, em Londres e no Museu Militar da Escócia. Um personagem que ajudou a idealizar mais de 4mil Centros de Tradições Gaúchas – CTG, que hoje contam com mais de 5 milhões de pessoas no mundo. “Gravo composições e escrevo livros não para vender e sim para perpetuar o que aprendi”, enaltece Côrtes, que revela ter doado às entidades ou empresas que têm a responsabilidade em divulgar e preservar a cultura, mais de 350 mil livros. Para Côrtes, a cultura não para, se transforma. Por isso, é preciso ter herança e ela estar documentada. Há renovação, mas sem perder a originalidade.

Sobre a identidade de um povo, o tradicionalista se emociona ao falar dos símbolos e das representações. Para ele o símbolo tem respeito eterno. O símbolo é imorredouro, ele continua na identidade da raça. Não somos simplesmente um passageiro transitório da vida.

“Sou do Rio Grande, não porque ando pilchado (indumentária gaúcha ), ou bebo mate, e sim porque a minha essência representa coisas do meu passado. As coisas mudam, mas a essência não”.

Paraíso das Orquídeas – Maralúcia
O comunicador viaja para pesquisar e identificar novos valores, liderando um processo de desenvolvimento da cultura regional. Esse foi um dos motivos da sua visita, como citei no início do texto. Em Maralúcia, há um movimento idealizado pela Família Lourenci, da Paraíso das Orquídeas, que está realizando um sonho em um sítio composto por mata preservada,  lagos e um orquidário que tem mais de 15mil plantas de diversas espécies e, em breve, irá inaugurar a Pousada Paraíso das Orquídeas, que está se preparando para receber turistas de todas as regiões do Brasil e do exterior. Um local que trará lazer, entretenimento, esportes e, principalmente, o tradicionalismo e o resgate da cultura regional.

“Vejo com entusiasmo e nunca imaginei vivenciar o que estou vivendo aqui, hoje. Vejo flores, mas vejo perspectivas de um novo rumo, certo, sem inventar moda. É a herança se mostrando através das gerações, levando a mensagem do movimento através da dança, do lazer e da recreação. Os costumes são símbolos presentes nesta instituição. É a base, mas será além das ‘muralhas’ da cidade, para a grandiosidade do universo. Fico feliz em cultuar com esse momento. É o despertar que encontra as razões de ser”, enaltece Paixão Côrtes, referindo-se ao Paraíso das Orquídeas.

A família Lourenci está desenvolvendo um projeto que valoriza as pessoas da própria comunidade com a formação de um grupo de danças, equipe de colaboradores para trabalhar no orquidário e na pousada, na produção de móveis para o próprio sítio, artesanato, bordado especial nas roupas da pousada, (feito pelas artesãs da vila), entre outras formas de promover o desenvolvimento local. Além desse resgate, visa promover a identidade e a cultura regional. Côrtes veio conhecer o projeto e também contribuir por meio do seu trabalho e de suas pesquisas sobre tradicionalismo e divulgação da cultura.

Ivanir Gebert